terça-feira, 25 de novembro de 2025

Anotações sobre o livro "Cartas para uma negra" - em 25nov2025

 

Livro: Cartas a uma negra

Autora: Françoise Ega

 

No início, é ignorada pela família onde trabalha. Não é chamada pelo nome. É apenas a serviçal.

Uma trabalhadora doméstica negra, antilhana, que agora mora e trabalha em Marselha, e tem o hábito de ler a revista Paris Match no trem, enquanto vai para o trabalho. Em um dos números dessa revista, conhece a autora brasileira Carolina Maria de Jesus e, então, passa a escrever cartas, nunca enviadas, para a brasileira.

Fala do seu cotidiano no trabalho e em casa.

Em princípio, o marido não incentiva muito a sua vontade de escrever.

Há várias passagens que mostram a maldade da patroa:

Pág 11, “...ela pega um tapete empoeirado e se põe a sacudi-lo justo no lugar que acabei de deixar brilhando! Preciso recomeçar...”

Há outras passagens semelhantes nas pág 11 e 12.

A patroa prefere que a casa fique com as cortinas das janelas fechadas. A Autora, pág 13, diz, “...se fosse rica, evitaria as cortinas que acumulam poeira e os imóveis de dois andares nas avenidas movimentadas. Teria uma casa ensolarada no campo...”

A autora vai analisando / comparando o modo de vida dos ricos com a sua. Na pág 13, “...ando de um lado para o outro entre o fedor das meias, ...entre livros que nem sequer teremos tempo para ler e meninas que desconhecem as piscinas públicas e as caminhadas”. E ao chegar em casa, pág 13, digo às crianças: “...depressa, respirem e abro a casa para que o sol entre...”

Na pág 15, a autora narra uma situação que é bem comum no Brasil: patroas pagam a passagem de ônibus para que meninas venham trabalhar em suas casas como faxineiras. Depois, fazem com que a menina fique com dívida eterna.

Nas págs 17 e 18, “...o futuro é dos que cedo madrugam. Sempre me levantei cedo, porque o pobre levantar cedo não é uma questão de futuro, mas de presente...”, aqui a autora volta a falar do seu dia a dia no trabalho, mostrando que vencer na vida e no trabalho não é questão de levantar-se cedo. [subir a pé pelas escadas 8 andares, pois o elevador está enguiçado; quando a autora abriu as janelas para entrar o ar, a patroa lacrou hermeticamente todas para que o ar não entrasse...]

Na pág 30, a autora explica como barram as negras nas vagas de emprego e por que elas terminam nas faxinas: “...tinha lido num jornal que precisavam de uma datilógrafa..., mas a diretora disse que a vaga não estava mais disponível...” Dizem para voltar no outro dia que “entraremos em contato”.

Nada muito diferente do que acontece no Brasil!

“...então você fica de saco cheio e procura uma agência de empregos para faxineiras...”

É preciso garantir o ganha-pão!

Na pág 33, “...me debruço então sobre uma nova página e a encho de realidade”. Depois que o marido, maldosamente, diz que sua escrita não passa “...de uma papelada, que nunca dará frutos...”, e tenta sugerir que ela escreva sobre lanchonetes, piscinas e praias, pois ninguém vai se interessar pelos escritos dela, então a autora resolve escrever sobre as histórias dos negros!

Na pág 41, a autora pede demissão do trabalho.

Fosse só pelo patrão, ela ficaria no emprego, infelizmente, “quando ele saía, eu chegava”. A patroa achava uma pena eu ir embora, “quem vai descer os tapetes sem reclamar? ...pela primeira vez, me perguntou pelos meus filhos, ...finalmente, me descobriu!” “...não podia contar ao patrão como era difícil trabalhar ali por causa da personalidade instável da esposa...”

Na pág 44, a autora diz que está com dor de garganta das brabas, “mas não conheço muitas donas de casa que ficam na cama.”

Refletindo sobre a doença, na pág 45, reconhece que o marido é o motor da casa, mas ela é o combustível. E sem combustível o motor enferruja. Ela avalia que tudo na casa passa por ela.

Doente na cama, ouve no rádio sobre uma autora polonesa que ganhou prêmio escrevendo sobre as mortes na segunda guerra mundial. Na sequência, pág 46, ouve padres falando e quis acrescentar, “...dos campos de morte, livrai-nos, Senhor. Do racismo, de onde quer que venha, livrai-nos, Senhor”.

As vozes que se escutam nos rádios possibilitam criar imaginação. Na pág 47, “...são imagens que temo serem extintas pela televisão...”, “...a tevê é a realidade nua e crua ao alcance de todos; a geração que está chegando jamais será capaz de sonhar...”

O marido joga um balde de água fria nas pretensões de escritora da autora: “...desliga esse rádio e trata de dormir..., joga esse caderno para o alto, você nunca será uma escritora...”

Na pág 50, a autora fala sobre os “nossos homens”. São homens de família, que esperam encontrar uma empregada antilhana que sirva como “intermediário”, ao que a autora responde que “para esse novo tráfico negreiro, o “intermediário” tinha que ser oficial...”

Na sequência, a autora diz que “...os franceses não são complicados, imediatamente, sabemos o que pensam, o que querem...”

Na pág 53, a autora fala em um mendigo que anda sumido. Mas sempre que ela dá um franco a ele, ele não vai comprar vinho, mas um sanduíche com linguiça e mostarda.

Bem diferente dos nossos mendigos de hoje, que vão logo comprar drogas!

Na pág 55 e seguintes, é possível notar que se exige muito dos empregados domésticos: lavar vários andares de escadarias, lavar calçadas, tonéis e outros.

Até a água congelada que saía da torneira dizia à autora: “Fuja depressa! Fuja depressa!”

Na pág 60, procurando outro emprego, “entraremos em contato”, diziam, após olharem bem a cor da pele. E as empregadas tinham que se resignar, pois era preciso pagar o pequeno quarto.

Nas págs 67 / 71, quase todos antilhanos que moram na França estão casados com mulheres brancas francesas. São amigos da autora. Um deles fala que o sogro o chama de preto sujo. 

Nas págs 74 / 76, a morte de Roland, um antilhano morto quando vai visitar a amante, uma loira francesa.

Diminuí as anotações, pois está chegando o dia do nosso encontro no Grupo, caso contrário, não vou conseguir terminar a leitura da obra. Até o final, farei só anotações bem significativas.

Na pág 104, se diz “que as empregadas não contam”. “...somos em cinco, as crianças não comem e os ‘outros’ não contam!”

Aqui é a fala da patroa restringindo a comida na casa.

Na pág 106, “...nunca me chamou pelo nome até aquele momento...”, “só soava a campainha: duas vezes para a negra; uma para a governanta”

É um distanciamento intencional muito grande!

Na pág 109, a autora percebe que está recebendo 25 centavos de franco por metro quadrado para esfregar o chão. Imediatamente, pede demissão!

Na pág 111, a autora descobre que precisa cuidar das mãos devido ao uso de produtos de limpeza, e por passar da água quente para a fria. “...é exatamente quando você acaba de dar tudo de si em uma cozinha fervendo... sentem a necessidade de fazê-la enxaguar lingerie que não tolera água quente”.

A autora chega a pensar: “Meu Deus, coloque-a na miséria por uma semana! Só uma, para torná-la uma pessoa mais compreensível”.

E assim, o livro vai mostrando o embate entre patroas e empregadas negras!

Da pág 112 a 121, a autora pensa na publicação do livro, em como conseguir dinheiro para a edição e, procurando em anúncios de jornais, consegue vaga como costureira em um hotel que, mais tarde, descobre ser um bordel. O trabalho consiste em cortar lençóis ao meio e aproveitar as melhores partes dos tecidos para costurar um novo lençol.

Da pág 128 a 131, a autora descreve a distribuição de carne e derivados para a população pobre. É vendida a 5 francos a porção.

A autora compra 3 porções, e aquelas que não servem as joga no lixo, sabendo que em breve pessoas que não têm dinheiro começariam a aparecer para vasculhar o lixo.

Na pág 134 a 136, a autora fala “transformei-me em uma máquina a ser explorada, mas talvez não manipulada...”

A autora estava substituindo uma empregada doméstica que estava doente e internada em hospital.

A empregada anterior trabalhava 12h por dia, a substituta trabalhava 4h. A patroa não concordava com isso e estava disposta a interromper a internação da empregada titular.

Na pág 137, a autora está limpando os vidros de uma janela muito alta. O marido da patroa manda parar o serviço para evitar acidente dentro de sua casa.

Aqui a autora está falando sobre o poder das patroas: quando se tem o poder de dizer “faça”, “suba”, que no mínimo seja dito com gentileza!

Na pág 139, a autora diz que quem foi empregada doméstica está vacinada contra tudo que a vida pode apresentar. São despojadas de qualquer pretensão à dignidade humana. São coisas. Vassouras. Geladeiras.

E conclui: “se um dia for rica, fico enojada só de pensar em contratar numa faxineira, não quero me tornar uma daquelas mulheres que ainda se dizem cristãs!”

Na pág 140 a 143, antilhanos pretos, comandando um baile, discriminam empregadas domésticas pretas.

“...é a lógica do mais forte...!”, diz a autora para a Carolina.

Na pág 144 a 145, a falta de respeito continua. A autora diz [144] que em 5 dias estará de férias. E a patroa diz que só entrará de férias em agosto e pede que a autora fique até agosto trabalhando.

Foi contratada como costureira, mas a patroa a colocou como faxineira. “Faz tempo que queria uma negra para a faxina!”

Na pá 152, a autora está com viagem marcada para Paris. Pretende levar por 10 dias as crianças para passear.

A patroa pede que a autora adie a viagem para que fique no lugar da filha na empresa.

Se uma branca substituir a filha no escritório de advocacia, talvez a filha perca o emprego, sendo uma negra a substituir, a volta da filha ao emprego está garantida [153].

E o marido incentiva que a autora suspenda a viagem e vá para o escritório fazer a substituição.

As empregadas domésticas sofrem discriminação! Na pág 158, enquanto a autora cuidava da vida dos outros [a da pastora], o patrão chaga e diz que é bom relaxar um pouco. A autora reflete, “...gostaria de saber se o doutor agiria do mesmo jeito comigo se um dia eu varresse a casa dele!”

Na pág 159, o patrão oferece refresco para saciar o calor, enquanto a autora pensa que um ano atrás, como empregada doméstica, passava a língua nos lábios ressecados para abrandar o calor, e a autora percebe que, a depender da profissão, “...passa da condição de burro de carga à de ser humano”.

Na pág 166, enquanto as crianças se divertem e comem, a autora vê sua bolsa se esvaziar. Alegria dos filhos, tristeza dos pais!

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