Ontem, realizamos virtualmente nosso encontro para analisar o livro Torto Arado, autoria de Itamar Vieira Júnior.
Segue as palavras iniciais do Coordenador ao encontro:
Falando aos novos participantes:
Objetivo do grupo:
O Quilombo Literário é um grupo interdisciplinar formado por professores e não-professores interessados em trocar experiências sobre a temática negra. Nas conversas de roda, diferentes pontos de vista sobre a obra analisada devem aflorar. Nenhum ponto de vista é mais correto que o outro. Isso apenas reforça a ideia de que podemos aprender alguma coisa com os outros. Muitas vezes é um detalhe que nos passou despercebido. Através das conversas de roda, o Quilombo Literário pretende estimular a leitura de autores negros, melhorar a capacidade de interpretar e discutir ideias, aprimorar a escrita de textos voltados à questão negra.
Cada participante comenta o que lhe pareceu interessante na obra estudada. As ideias da obra estudada servem como ponto de partida para a conversa, a obra é o fio condutor.
Falou-se, ainda, que no dia 08 de setembro de 2020, publicamos na Revista eletrônica "CearáCriolo" um texto sob o título: Quilombo Literário: O Clube de leitura cearense focado em escritores negros.
Também no dia 02 de outubro de 2020, participamos do XI Congresso Internacional Artefatos da Cultura Negra, na Universidade Regional do Cariri [URCA], onde apresentamos trabalho sob o título : "Experiências de um Quilombo Literário em Fortaleza - CE: Literatura Negra, narrativa e afetos".
Há um texto em elaboração, a ser publicado na Revista Africanidades, onde se fala do Quilombo Literário em geral, e da apresentação na Urca. Segue um extrato deste texto, está na página 6:
"A apresentação do nosso trabalho chamou a atenção do mediador por ser o único com temática fora da academia. O mediador ficou encantado que, apesar dos tempos difíceis que se vive na educação, há coisas interessantes acontecendo dentro e fora dos muros da academia. Na visão dele, nosso trabalho chamou atenção por trazer o hábito da leitura para dentro de um grupo, e essa leitura não está presa à análise profunda do pensamento do autor, mas carrega além do autor, as vivências de cada participante do grupo. "Gostei!", nos disse o mediador!"
Segue a avaliação inicial do Coordenador sobre o livro:
Torto Arado
Na
pág 127, encontrei a melhor definição para o título do livro.
É
quando Zeca do Chapéu Grande dizia “vou trabalhar o arado”, “vou arar a terra”,
“seria bom ter um arado novo, esse arado está troncho e velho”.
Era
um arado torto, deformado, que penetrava a terra de tal forma a deixa-la
infértil, destruída e dilacerada – continuava a narração.
Dilacerada
também estava a vida daquelas pessoas:
- Aquelas pessoas
trabalhavam pela morada. E o que era a morada? Eram pessoas que vinham caminhando
de fazenda em fazenda a procura de uma morada em troca de trabalho.
- Além de
trabalharem nas terras grandes para produzirem para o Senhor, precisavam
cultivar seus próprios roçados em volta da morada para seu próprio sustento. E
o Senhor ainda levava para si cerca de 30% do produzido nesse roçado.
- Os maus tratos a
mulheres estão presentes na narração: Tobias é um bom exemplo: bebia, batia na
mulher, ficava dias sem aparecer e casa.
- A interdição do
cemitério. Isso é impactante na vida das personagens. É uma quebra das
identidades religiosas, familiares e territoriais.
- Um movimento
tipo o MST surge para tentar recompor a dignidade dos trabalhadores da fazenda,
mas o assassinato é o destino da liderança!
- São negros
lutando pela terra, pela dignidade, pelas tradições e identidades.
Há
mulheres fortes na trama: Bibiana, Belonísia, Maria Cabocla, e outras, que
lutam para estudar, crescer, comprar uma terra para si, fazer uma casa de
tijolo que desse pertença e permanência aos negros daquelas terras.
Na
capa do livro já se vê que se pretende falar de negros. E de negros rurais! E
ainda é no Brasil rural que é possível perceber que tivemos, mais nitidamente,
uma abolição inconclusa.
O
autor vai montando a narração, mostrando que aquelas pessoas vivem vida análoga
à da escravidão, onde negros perambulam de terras em terras, por gerações
seguidas, em busca de morada que trocam por sua força de trabalho. As condições
de trabalho e de vida são bem parecidas com as da escravidão. Mas há
trabalhadores fortes e destemidos que se opõem a este modo de vida e de
trabalho. Aliás, quando que a história do negro não foi carregada de dor e de
luta.
O
autor utilizou capítulos curtos, facilitando a leitura, já que a história é
pesada, pois analisa as raízes da estrutura social do país. A narrativa vai
mostrando como que através da luta e da resistência as tradições orais,
alimentares, religiosas e de trabalho puderam atravessar os tempos.
O
livro é bem escrito. Utilizou a técnica de três narradores diferentes, o que
alterna a visão do leitor sobre a vida naquelas terras.
A
narrativa passa, ainda, pelas parteiras que trouxeram à luz todas as crianças
que nasceram na fazenda; pelo conhecimento das raízes e folhas para vários
tratamentos; passa também pelas secas e enchentes que alteram a quantidade e
qualidade alimentar dos trabalhadores da fazenda. O negro está por sua conta e
risco na fazenda! O Senhor da fazenda mora na capital, pouco vai à fazenda, não
sabe e nem quer saber das dificuldades dos trabalhadores, dos novos escravos!
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